quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Especulação das relações humanas



Bolsa de Wall Street

O Brasil é tardio em seu desenvolvimento capitalista e seu crescimento segue motivado em consumismo. Nos anos JK o governo investia em estradas, o setor privado em montadoras de carro, enquanto ao povo “recebia” condições para comprar estes produtos. Tal visão se estendeu para outros bens de consumo que viriam a alterar os hábitos das pessoas e família.

No período atual há também o consumo de imagens. Se antes era “ser” e depois passou a “ter”, hoje basta apenas “aparentar ter”. A Sociedade do Espetáculo na qual as relações são intermediadas por meios de comunicação potencializaram o lado violento e competitivo do capitalismo.

Marcas e produtos são sinônimos de status e com redes sociais os consumidores podem exibir seus fetiches para sua rede de contatos, uma versão menor do que fazem as celebridades em programas de televisão e revistas semanais além de manterem suas atividades na ciberesfera.

Pessoas perdem suas características e se tornam produtos com valor agregado conforme os objetos e outras pessoas-produtos ao qual estão aliadas. Alguns conseguem se transformar em marcas. Há artistas mais conhecidos pela vida pessoal do que pela obra.

O crise econômica de 2008 afetou países fazendo muitos questionarem a sociedade na qual vivemos. Jovens e até mesmo idosos vivem a insegurança de não saber se terão condições de saúde e emprego, investimentos em bem-estar social vem sendo cortados, principalmente nos países Europeus conhecidos pela infame sigla PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha).

Onde o governo manteve como política a atuação dentro da economia, mesmo que de forma moderada, o estado não viu rombos enormes. Houve um equilíbrio entre Estado-nação e liberalismo, porém estas medidas são incomodas aos grandes capitalistas.

A Grécia vê o crescimento da extrema-direita representada pelo partido Aurora Dourada, na Espanha imagens mostram filas de garotos e garotas procurando vagas no mercado. Nos EUA a turbulência de cinco anos atrás desestabilizou o mercado imobiliário. Jovens antes saiam da faculdade para morar sozinhos, porém na conjunção do momento voltam ao lar dos país ou saem para outros países. Compraram educação em parcelas altas e quando saem perceberam estar em uma fábrica de desempregados. A desigualdade social neste país aumentou, vivem o pesadelo americano.

Há dois anos Londres foi incendiada por protestos. Não se via cartazes políticos ou líderes discursando. Apenas o saque de lojas e rostos raivosos acompanhados de pontapés e socos contra o establishment. Para o sociólogo Zygmunt Bauman, eram aqueles alijados da sociedade de consumo.

Os fenômenos citados acima são reflexos da crise econômica e junto a ela está a ausência de ideologias. Partidos políticos assumiram uma agenda pragmática. Unidos com conglomerados internacionais visam o lucro. O príncipe não tem mais a feição de Cesare Borgia ou Napoleão, mas é composto de um think-tank e esses grupos guerreiam entre si por cada vez mais poder e dinheiro.

Com a população imersa em insegurança este sentimento encontra eco no narcisismo e por vez chega ao consumismo. As compras preenchem momentaneamente o vazio. As imagens no Facebook com sorrisos escancarados exibindo uma aquisição ou mesmo o próprio produto em fotos com filtros no instagram são reflexos deste quadro.

Os hábitos mudaram, a ascensão econômica no Brasil significa emancipação, educação é um negócio como tantos outros e o diploma também é visto como uma honraria a conduzir para outro patamar de consumo.

Príncipe sem face

O Príncipe Eletrônico, o think-tank, composto por setores da economia, academia, política e militar, mantém este ordenamento. A população está tão dopada em suas compras e pouco questiona os rumos da sociedade. Dias especiais lhe dizem quando comprar e a propaganda aponta o que comprar.

Em meio a isto surgem movimentos contrários. Occupy Wall Street e Primavera Árabe são alguns casos. Mas serão eles suficientes para pressionar por relações menos predatórias? Por outro lado há o regresso de ideias preconceituosas de misoginia e xenofobia calcadas no fascismo e este cresce aos poucos seja na internet ou nas ruas.

O capital especulatório, no qual dinheiro faz dinheiro, devora os cidadãos de suas condições de sobrevivência e assim terminado o seu “trabalho” move-se para outra terra e neste momento O Príncipe Eletrônico perde um braço para adquirir outro. Estados disputam como irmãos a atenção do pai capitalista e este fornica com os Estados conforme lhe for conveniente.

As atividades militares reforçam este domínio. Enviadas para solo estrangeiro com a premissa de conduzir determinado país para a democracia ou mesmo em uma cruzada por direitos humanos, porém são vistas em locais ricos em recursos naturais e combustíveis. Os desprovidos de meios lucrativos ou em posições estratégicas ficam à própria sorte.

Esta relação é vista em filmes como O Capital (2012) de Costa-Gravas e Wall Street (1987) de Oliver Stone. O liberalismo em sua pior face simulando distribuir riquezas. Por outro lado países assumidamente socialistas distribuíram sua pobreza aos cidadãos.

Interesses financeiros atravessam fronteiras, desrespeitam direitos humanos e em muitos casos deixam o terreno infértil e propagam o trabalho forçado. Isto é mantido pelo consumismo, vindo do narcisismo e do individualismo. Assim como há pessoas em condições de escravidão há os escravos das marcas.

Entretanto, apesar de protestos e ativistas, a grande parte da população continua imersa nestas relações do capital especulatorio e de consumo. As vozes adversas quando não são sufocadas passam por um processo de marginalização ou mesmo ridicularização.

Países periféricos estão perdidos em doenças e veem as crises dos europeus como rotina. Indústrias seguram o controle de patentes impossibilitando acesso maior da população mundial à saúde. Por outro lado a imagem de pobreza vende jornalismo e também obras de ficção.

Com tantas imagens sobrepostas é difícil distinguir o fato do imaginário seja em telejornais ou em games. Intervalos comerciais ou merchandisings inseridos no veículo ditam de forma velada ou escancarada os hábitos e a importância do indivíduo.

As décadas passam e a riqueza permanece concentrada nos mesmos sobrenomes salvo um jogador ou outro que cai ou entra para o círculo fechado. A manutenção de poder é uma tradição familiar.

Eric Hobsbawn apontou em seus texto que vivemos na barbárie, e é difícil discordar. Armas químicas e nucleares são utilizadas para manter a ordem. Os telejornais não podem mostrar muito do que se passa nos campos de batalha ou mesmo nos salões do poder. O jornalismo investigativo vem perdendo força e investimentos e o jornalismo em si está cada vez mais semelhante à publicidade.

O Príncipe Eletrônico é ainda mais violento que Borgia ou Napoleão. O primeiro participava de batalhas junto aos seus comandados e foi de uma época na qual nobres duelavam e tinham como incumbência defender seu povo, enquanto o segundo cresceu na hierarquia militar e acampava com seus comandados. O senhor da guerra e do capital atual não tem face, esta protegido em bunkers, palácios e mansões.
O cinema com histórias de heróis, rostos dramáticos e corpos de Adônis dão beleza à barbárie. Walter Benjamin definiu existir beleza no bélico e um jogo de câmeras e trilha sonora expandiu isto com músculos e suor. O erotismo justificando a doutrinação de povos.

Nesta mesa grande o Brasil tem expectativas de sentar e se servir. O marketing privado e público apresentam o país como um paraíso tropical e sexual capaz de hospedar Copa do Mundo e Jogos Olímpicos e com a ânsia de um assento na Organização das Nações Unidas.

Porém o Guarani chora, não por Cecília, mas pela violenta forca de Torquemada. A Inquisição anseia usurpar suas terras para criar gado. Os bandeirantes voltaram, mas desta vez com chapéus, botas de crocodilo e taillers. O exterior parece mais preocupado com as tribos do que a imprensa local.

A população carente segue vendo os filhos e netos da Candelária sendo massacrados nas noites da periferia. No Plano Acelerado de Crescimento (PAC) Direitos Humanos e Meio Ambiente não entram no menu, mesmo assim o Brasil quer comer no self-service da ONU.

O capital vai sugar mais e mais. Não é possível determinar qual será o fim da crise político econômica, mas ela ainda trará muitas perdas. Enquanto isto famílias comem seu jantar com iPhones e iPads em mãos.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Editor de texto e pós-produção de entrevistas em Orgulho de Ser Brasileiro



Sinopse

O documentário “Orgulho de Ser Brasileiro” discute o sentimento envolto na mais emblemática frase que se ouve no país – e que dá título ao filme - a partir de depoimentos de vários brasileiros.

Numa narrativa de busca pessoal do diretor pelo sentimento de orgulho de ser do Brasil, entrevistados como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o artista plástico Romero Britto, o técnico de futebol Carlos Alberto Parreira, a geneticista Mayana Zatz, o filósofo Roberto Romano, o dramaturgo Gerald Thomas, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, o escritor Ferréz, os músicos Max de Castro e Simoninha, o jornalista e empresário radicado na Flórida Carlos Borges, a corretora de Imóveis em Miami Yara Gouveia, o colunista de vinhos Didú Russo, o ex-ministro da Saúde Adib Jatene e o bispo emérito de Blumenau Dom Angélico Sãndalo Bernardino se dividem em depoimentos ao longo do documentário questionando o Brasil e se questionando sobre a cultura dos brasileiros e o momento do país.

Ancorado numa narrativa dinâmica com fotografia conceitual que explora vários ângulos dos entrevistados e depoimentos reveladores, o filme é permeado por trechos do hino nacional interpretado por Badi Assad. Num formato provocativo, promete ir muito além do “Ouviram do Ipiranga” ou do sentimento-padrão de que “o brasileiro é o melhor povo do mundo” a que nos acostumamos.

Não é ufanista. É pra discutir.

Não é contra o Brasil. É a favor.

É real.

Feito por brasileiros.

Sem intermediários.



Synopsis


Pride of being Brazilian is a documentary which discusses the most emblematic phrase that you hear in Brazil. The plot is the combined result of several interviews with Brazilians.

Based on the director’s personal search for the pride of being Brazilian feeling there are interviews with the former Brazilian president Fernando Henrique Cardoso, the plastic artist Romero Britto, the football coach Carlos Alberto Parreira, the environmentalist Marina Silva, the geneticist Mayanna Zatz, the philosopher Roberto Romano, the writer Ferréz, the brothers and musicians Max de Castro and Simoninha, the theater director Gerald Thomas, the Catholic bishop and social activist Dom Angélico Bernardino, the real estate broker Yara Gouveia, the wine expert Didú Russo and the journalist Carlos Borges in which they talk about the country, the Brazilian culture and this special moment for Brazil in the world.

The film explores a new concept of the feeling of pride in Brazil from different angles of photography and perspectives of the personalities interviewed. Together with the Brazilian National Anthem, which permeates the documentary, performed by Badi Assad in a unique and provocative way, it takes us beyond the original meaning of the Anthem and the exaggerated Brazilian self-description that“Brazilians are the best people in the world”.

It’s not strongly nationalistic. It’s just to provoke discussion.

It’s pro. Not against Brazil.

Just real.

Made by Brazilians.

With no foreign interference.

Degeneração Y

Os personagens animados Beavis e Butt-Head, com suas cabeças deformadas, vomitam impropérios causticamente contra costumes americanos e de outras culturas; o roqueiro Kurt Cobain cantando sobre a vontade de tirar a própria vida; o rapper Tupac Shakur entoando versos aludindo a sexo e tiroteios; os lutadores de telecatch Shawn Michaels e Triple H, junto ao boxeador Mike Tyson, apontando repetidas vezes para suas virilhas e gritando “chupa” para a plateia, enquanto no outro canal Scott Hall, Kevin Nash e Sean Waltman, amigos do outro trio nos bastidores, reproduzem o gesto numa atração rival.

A cultura de massa dos EUA nos anos 1990 foi marcada pelas figuras citadas acima, expoentes da geração X. Cenas de desrespeito por figuras de autoridade não necessariamente por rebeldia, mas em muitos casos por hedonismo, cinismo ou desilusão. Michaels e Triple H se intitulavam “Degeneração X” e diante câmeras alcançavam milhões de lares nos EUA e outros países do mundo. A globalizada MTV por sua vez expandiu a fama de 2Pac, Cobain e Beavis & Butt-Head em ainda maior proporção.

O romantismo e valores morais dos baby boomers foram trocados por pragmatismo. A Sociedade do Espetáculo de Guy Debord era cada dia mais alimentada. A televisão adotou a linguagem de edição rápida de videoclipe e o exibicionismo abria espaço para os “15 minutos de fama” alertados por Andy Warhol.

A convulsão do império
O narcisismo é oriundo da insegurança, conforme o historiador Christopher Lasch em Mínimo Eu (1984) e somando as ideias deste autor com as dos intelectuais citados acima e adicionando a comunicação de massa e o entretenimento no mundo globalizado é possível adiantar o que viria depois. Catalisada pela internet, surgiu a Geração Y. Com seus computadores pessoais, estes que são a principal força de trabalho do momento e futuros líderes políticos e empresariais potencializam sua capacidade de serem estrelas mesmo que para um público próprio e segmentado. O minuto de “fama” está garantido.

O ego e o narcisismo estão nas telas de YouTube, comentários em sites, blogs, Instagram e outras ferramentas que perderam espaço há pouco tempo ou que vão perder e serem substituídas na liquidez da internet. Para eles, existir é estar online. Tendo que muito deste narcisismo venha da insegurança. São observados contemplando o futuro desconhecendo o que os espera. Muitas carreiras podem ser seguidas e não apenas opções tradicionais como no período de seus pais e avós.

Por outro lado, ao mesmo tempo em que possuem uma vasta gama de personagens para interpretar no mercado de trabalho, há muitos atores buscando o mesmo papel. A ruptura econômica de 2008 mostrou no que o sonho americano havia se tornado e aliados e colônias despertaram convulsionando com o império.

Como semideuses

Em janeiro, a Espanha recebeu ao todo 4,98 milhões de pedido de auxílio-desemprego. As imagens das filas de emprego mostram muitos rostos jovens. A Grécia, berço da civilização, está quebrada e as cenas mostram muitos rostos sem marcas de tempo e expressão vociferando revoltados com o fim do mundo que conheciam. Em 2011, a revolta que tomou as ruas da Inglaterra, “foi um motim de consumidores excluídos”, analisou o sociólogo Zygmunt Bauman. Os Brics aparecem como vedetes da Nova Ordem Mundial, porém ao se olhar com cuidado é possível ver que agonizam com problemas de estrutura e Direitos Humanos.

Para aliviar a melancolia, a Geração Y busca alento no consumismo das marcas e “pornificação” de objetos e relacionamentos. Enquanto os preços dos imóveis não reduzem são pequenos reis em seus quartos morando com os pais comandando seus exércitos em games online. Conforme o mundo evolui, a Sociedade do Espetáculo vai acentuando seus traços. Festejam por festejar. A política cedeu espaço para a imagem, a rebeldia pronta para ser clicada e estampada em passeatas que terminam em “cervejadas”, “churrascadas” e outras “adas” acompanhadas por artistas cujos nomes não perduram por mais de uma década.

Como semideuses, estão sempre gozando nas redes sociais. Porém quando as luzes azuladas de iPhones se apagam, o som da música eletrônica é usurpado pelo silêncio e os filtros do Instagram não funcionam, esses meninos-homens contemplam o vazio horizonte com olhos cansados de idosos e percebem que estão “chupando”.

Artigo publicado originalmente no Observatório da Imprensa